Evito escrever sobre acidentes marÍtimos, principalmente quando hÁ perdas de vidas humanas. Prefiro contar fatos mais alegres de embarcaÇÕes de todos os tipos e todos os tempos.
Apesar da minha preferÊncia, não posso deixar de relatar certos acontecimentos tristes, como a tragÉdia ocorrida com o rebocador de alto-mar Guarany, da Marinha do Brasil, em 1913.
O Guarany era contemporâneo do rebocador Laurindo Pitta, este uma relÍquia da Marinha que sobrevive ao tempo!
Para recordar esse triste episÓdio da HistÓria da NavegaÇão no Brasil, transcrevo texto do livro Sinistros MarÍtimos – Costa do Estado de São Paulo – 1900/1999, de autoria do pesquisador e escritor marÍtimo JosÉ Carlos Rossini, radicado em Genebra, SuÍÇa.
Na obra, Rossini narra as principais tragÉdias ocorridas no Litoral Paulista, como o naufrÁgio do navio PrÍncipe de Asturias (1916), em Ilhabela (Litoral Norte do Estado de São Paulo), e os incÊndios dos cargueiros Austral (1966) e Ais Giorgis (1976), ocorridos em Santos.
Eis o que conta Rossini:
Para a realizaÇão de manobras de alto-mar, saiu de sua base no Rio de Janeiro, em 1.o de outubro de 1913, a Esquadra da Marinha de Guerra do Brasil composta dos seus dois grandes couraÇados, o São Paulo e o Minas Gerais, e por outras unidades menores (cruzadores, contratorpedeiros e navios auxiliares).
Segundo programa estabelecido pelo Estado-Maior, era o prÓprio ministro da Marinha na Época, o almirante Alexandrino de Alencar, a comandar a Esquadra.
Esta deveria proceder uma sÉrie de exercÍcios de simulaÇão e treinamento no trecho de mar compreendido entre as ilhas de São Sebastião e Alcatrazes.
O inÍcio dessas manobras estava previsto para noite do dia 3 e as mesmas deveriam prolongar-se no decorrer de todo o dia. Na manhã do dia seguinte a Esquadra deveria aportar em Santos, onde autoridades civis e militares haviam previsto a realizaÇão de diversas homenagens aos homens da Marinha, com grandes manifestaÇÕes populares de júbilo.
O desastre
Por volta das 2 horas da madrugada do dia 3, a cerca de 10 milhas ao sul da Ponta do Boi, Ilha de São Sebastião, ocorreu colisão, em plena rota de navegaÇão, entre o rebocador de alto-mar Guarany, pertencente à Marinha Brasileira e participante dos exercÍcios da Esquadra na ocasião, e o vapor cargueiro Borborema, do Lloyd Brasileiro.
Este último, sob o comando do capitão-de-longo-curso Thimoteo Évora da Silveira, encontrava-se em passagem de Santos ao Rio de Janeiro. Procedente do sul apÓs escala no porto santista, zarpara no dia 2 para a então Capital Federal, onde chegaria na manhã do dia 3.
As circunstâncias do choque nunca foram perfeitamente esclarecidas, sabendo-se, porÉm, que, na noite do acidente, a visibilidade era boa e, embora não houvesse luar, tambÉm não havia neblina ou chuva.
A colisão ocorreu com a proa do Borborema entrando no costado do Guarany, este indo, em consequÊncia, imediatamente a pique. Levou consigo para o fundo do mar 28 de seus ocupantes e, entre estes, oito jovens guardas-marinhas da Escola Naval do Rio de Janeiro embarcados para adestramento.
Os demais eram tripulantes de serviÇo ou oficiais do rebocador e, entre os desaparecidos, o prÓprio comandante, primeiro-tenente EleutÉrio do Couto, 28 anos. Foram salvos sete guardas-marinhas.
O Borborema, que no choque sofreu apenas leves danos, prosseguia viagem atÉ o Rio de Janeiro escoltado por unidades da Marinha. Seu comandante, acusado de “omissão de salvamento”, respondeu a inquÉrito naval.
Nas proximidades da Área onde ocorreu o sinistro, navegava rumo sul o transatlântico francÊs Espagne, da armadora SGTM, com 1.423 passageiros a bordo, sob o comando do capitão Talon.
O citado oficial declarou às autoridades da Capitania dos Portos, em Santos, onde o vapor atracou no mesmo dia 3, que em determinado momento avistara as luzes de duas embarcaÇÕes em rota de colisão, mas que nada pudera fazer para evitar o acidente.
Declarou tambÉm não ter invertido a rota de seu navio para prestar qualquer socorro para não colocar em perigo a vida de centenas de passageiros.
A tragÉdia ocorrida com o Guarany comoveu a opinião pública e provocou o cancelamento da visita que a Esquadra faria a Santos.
O então presidente da República, marechal Hermes da Fonseca, proclamou luto nacional para o dia 4 e, em todo o PaÍs, as bandeiras foram hasteadas a funeral.
Fonte: https://portogente.com.br/colu...uarany-em-1913-49467