Achei muito legal a matéria sobre esse grande veículo que foi projetado pela Engesa e que lamentavelmente não foi pra adiante.
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AS VERDADES DO OSÓRIO
Nos anos 80, o Brasil construiu um MBT moderno o suficiente pata ser dito como um dos melhores de seu tempo, o EE-T1 Osório fez história em sua época, foi um projeto ousado que atraiu olhares de varias partes do mundo para sua tecnologia e suas capacidades. Porém, hoje, com o projeto já acabado á 25 anos, muitos equivocos se fazem sobre ele.
Nos meados dos anos 80, a Exército da Arábia Saudita lançou uma competição internacional para escolher qual seria o novo MBT (Main Battle Tank – Tanque Principal de Batalha) da força terrestre saudita, que substituiria os já veteranos AMX-30B, de fabricação francesa, que já estavam obsoletos, se comparados as novas gerações de tanques que equipavam as forças da região na época.
Era uma competição interessante para qualquer empresa de defesa no mundo, pois o reino saudita adquiriria mais de 700 unidades do blindado escolhido e pagava bem pelos mesmos. Era a chance para qualquer empresa de defesa lucrar muito mais do que lucraria normalmente em um único golpe, isso atraiu muitos olhares de todos os lugares do ocidente, e um desses olhares, vinha de São José dos Campos, estado de São Paulo. Eram os olhares de uma empresa que já havia vendido muito de seus produtos para países do Oriente Médio como o Iraque e a Tunísia, e era já uma marca bem conhecida, eram os olhos da Engesa.
A fabricante brasileira viu na competição árabe, uma chance de conseguir retornar aos velhos tempos de grandes lucros com seus blindados sobre rodas, era uma chance única e digna de todos os esforços da empresa paulista. Com isso, a empresa decidiu canalizar todos os esforços na construção de um MBT moderno para a competição. Este MBT recebeu o nome do patrono da arma da cavalaria do Exército Brasileiro, o Marquês do Herval, General Manuel Luís Osório.
O EE-T1 Osório foi um projeto ousado de uma empresa brasileira para uma competição internacional, recebeu muito do que havia de mais moderno na tecnologia encouraçada mundial, e mesmo tendo perdido a competição para o M1A1 Abrams, de construção norte-americana, é um blindado admirável e digno de respeito. Porém, muito é dito sobre ele, muito é mentira, muito é verdade. Este post, por fim, mostrará algumas verdades e desmontará alguns mitos acerca do primeiro MBT nacional.
A Vitória Final
Muito se é dito sobre a suposta vitória do MBT da terra brasilis na competição saudita. A lenda reza que o Osório venceu todos os blindados da competição com folga (nestes, estavam o M1A1 Abrams, da General Dynamics, americana e o Challenger 1, da Royal Ordnance Factory, britânica) e que, acabou sendo derrotado na esfera política pela pressão do governo dos Estados Unidos da América. É uma história bem passional, às vezes, vem com comentários maldosos e antiamericanos. Porém, o fato difere em muitas coisas da história.
Após a volta das equipes de engenheiros da fabricante paulista para as terras tupiniquins, houve essa afirmação da vitória brasileira, se diz também de afirmações de oficiais britânicos e franceses sobre a superioridade do engenho brasileiro. Porém, maioria são enganos e más interpretações do ocorrido nas areias do deserto saudita.
O EE-T1 Osório realmente foi um dos escolhidos no fim da competição, porém tem que se prestar atenção nas palavras, um DOS escolhidos na competição. Ao fim do programa, dois blindados foram escolhidos como melhores e se decidiria qual seria escolhido pelas propostas das empresas, estes eram o Osório e o M1A1 Abrams. Restaria no fim, as empresas apresentarem suas propostas e o governo saudita decidir. Qualquer um dos dois poderia ser comprado pelos sauditas, porém venceu o americano por alguns motivos que, creio eu, foram fundamentais para a vitória.
- O blindado já estava em serviço na cavalaria do Exército Americano desde 1980, já era um blindado mais do que testado pelas tropas americanas na época (porém, ainda não havia sido testado em combate, o que viria acontecer só em 1991, na Operação Tempestade no Deserto, no Iraque).
- Já estava sendo construído desde 1979, a variante A1 (equipada com o canhão Rheinmetall L/44, de 120mm) já era construída em série desde 1986. Assim, havia capacidade provada de saciar a demanda do Exército Saudita pelo MBT.
- Os preços feitos pelos americanos seriam mais em conta, politicamente falando.
O fato dos oficiais franceses e britânicos terem falado tão bem do blindado brasileiro é resultado do fato que o mesmo realmente venceu-os tecnicamente. O Challenger 1 e o AMX-40 (que também participou da competição) foram, de fato, derrotados pelo blindado brasileiro.
Tecnologia nacional
Outra história muito dita sobre o Osório é o fato dele ter sido totalmente nacional. Muito se falava na imprensa da época (e muitos acreditam até hoje) que o Osório era provido de tecnologia totalmente nacional. Porém, a história é outra.
A Engesa, na época, sabia bem que a indústria de tecnologia nacional demoraria muito para prover tecnologia suficiente para o encouraçado tupiniquim. O fato é que era mais em conta e muito melhor para a Engesa que entrasse em acordo com empresas do exterior para a construção do blindado. A Engesa, nos protótipos, construiu o chassi do blindado, mas quase todo o restante era uma colcha de retalhos internacional.
O grupo mecânico era composto por um motor TBD 234, V12 refrigerado a ar e movido a diesel, construído pela germano-brasileira MWM International (que é, nada mais que uma filial da MWM GmbH, da Alemanha), era nada mais que um grupo gerador de eletricidade, adaptado para poder operar como motor de blindado, porém, gerava saudáveis 1.014 cv. Muitos dizem que o motor padecia de problemas de superaquecimento, porém é algo que não pode se afirmar com total certeza. O grupo também era composto pela transmissão LSG3000, de seis velocidades (quatro a frente, duas a ré), construída pela ZF Friederichschafen AG, da Alemanha. Esta transmissão era nova na época (havia sido projetada somente em 1984), e equipou um blindado pela primeira vez com o Osório (porém, pouco tempo após, equipar o C1 Ariete, italiano, o K1-88, sul-coreano e o AMX-30E modernizado, espanhol). O grupo mecânico foi escolhido pela Engesa pela possibilidade de as mesmas serem construídas no pais (uma vez que ambas as empresas contavam com instalações no pais). Os sistemas de suspensão hidropneumática, usados pelo Osório e também pelo Challenger 1, seriam construídos pela britânica Dunlop, as lagartas seriam similares as utilizadas pelo Leopard 2-A4, providas pela Diehl BGT.
A torre foi resultado de um acordo entre a Vickers Defence Systems, britânica e a Engesa. Ela seria construída já visando o Osório, porém, feita totalmente na terra da Rainha Elisabeth II (este acordo, dava até a construção sob licença da torre para a Engesa, após a construção de um número x de torres pela Vickers). A torre foi baseada na utilizada por um projeto de MBT da própria Vickers, o MBT Mk.7/2 (que teria capacidades parecidas com a do Osório, porém, não foi enviado para a competição). O projeto foi acompanhado e teve participação de engenheiros da Engesa (Ricardo Schiesser e Mario Santiago, para ser mais exato), principalmente no que se diz questão ao sistema de controle de tiro. A torre, se comparada a projetos anteriores da Vickers (como o Mk.5 e o próprio Mk.7/2), é muito similar aos mesmos. Este acordo com a Vickers levou a construção de dois modelos de torres para o blindado brasileiro.
- Um modelo para atender o mercado de exportação, equipado com um canhão francês de alma lisa GIAT G-1, de 120mm, sistema de controle de fogo britânico Marconi Centaur, equipado com dois periscópios franceses SFIM VS580 VICAS, para o atirador e para o comandante (sendo que o do atirador, era equipado com um telêmetro a laser e o do comandante era um modelo com visão panorâmica) e um sistema de visão noturna Philips UA9090, de fabricação holandesa, com visores para o atirador e o comandante.
- Um modelo para atender o Exército Brasileiro, equipado com um canhão britânico de alma raiada Royal Ordnance L7, de 105mm, sistema de controle de fogo Marconi Centaur, sendo equipado com periscópios OiP LRS-5DN (comandante) e LRS-5DNLC (atirador), ambos com sistema de visão noturna.
Ambas as torres contavam com sensores para prover parâmetros de disparo para o sistema de controle de fogo e uma metralhadora de ação por corrente Hughes EX-34, em calibre 7.62x51mm NATO, de construção americana, posicionada como metralhadora coaxial, metralhadoras pesadas belgo-americanas FN/Browning M2HB, em calibre 12.7x99mm NATO (.50BMG) em posição antiaérea, podendo ser substituída por uma metralhadora média belga FN MAG, em calibre 7.62x51mm NATO.
São de projeto (e tecnologia nacional) o chassi do tanque (construído pela Engesa) e a blindagem composta (que seria provida pela Chobham, porém diante da negativa da empresa britânica, esta tarefa foi dada aos engenheiros brasileiros do CTEx).
O fato é que quase todo o blindado contem equipamento de fabricação ou de projeto do exterior, porém um coisa deve ser deixada bem clara em relação a isso. O fato dos equipamentos serem do exterior não tira o mérito dos projetistas e engenheiros da Engesa, até dá mais mérito a eles, que conseguiram unir equipamentos de várias fabricações em um único blindado, dando a forma que o Osório tomou.
O assassinato
Outra mentira dita sobre o Osório é que o mesmo viria a destruir a Engesa ou que a empresa paulista foi vítima de um complô americano, devido a inveja de termos o “melhor tanque do mundo”. Porém, a história mostra que foi outra coisa que abateu a Engesa.
Da mesma forma que a portentosa Varig faliu no ano de 2006, a Engesa declarou falência no ano de 1993. Não por complôs secretos, mas sim por calotes e má gestão (a mesma forma que a Varig faliu). O primeiro, do Iraque a Engesa, que ficou a dever R$ 200 milhões, da compra de blindados e munições de 90mm e a segunda, da Engesa com o governo brasileiro, que emprestou R$ 1,5 bilhões via BNDES e Banco do Brasil, para cobrir a falha do Osório e o calote do Iraque, porém, os mesmos não foram pagos pela Engesa. Houve também um breve interesse do Exército Brasileiro em alguns projetos da Engesa (como o EE-T4 Ogum e o Osório), porém, não se concretizaram.
A fato é que a Engesa não precisou dos EUA para falir, fez isso consigo mesma.
O Renascimento
A última mentira sobre o Osório é bem mais recente. Se falam de boatos em que o Osório poderia ser reconstruído pelo Exército Brasileiro para ser posto em serviço como MBT (tapando uma lacuna interessante de MBT moderno para o EB). Outra mentira diz que o Osório seria um blindado moderno até hoje, e poderia ser facilmente posto em operação da mesma forma que foi concebido, nos anos 80. No fim, a coisa é bem mais difícil do que se parece.
Se formos comparar a versão do Osório que foi oferecida ao Exército Brasileiro com o carro de combate mais avançado usado hoje pela cavalaria do EB, o Leopard 1A5BR, se vê que o Osório é superior em certos quesitos importantes no campo de batalha sendo, de certa forma, superior ao blindado alemão. Pode-se citar:
- O motor: O Leopard 1A5BR utiliza um motor MTU MB 838 Ca-500, V10, refrigerado a ar, multi-combustivel, que provem ao blindado 830 cv. O Osório conta com um MWM TBD 234, V12, refrigerado a ar, movido a diesel, com 1.014 cv. A despeito dos supostos problemas de superaquecimento do motor MWM, o Osório se sairia com mais potência, uma vez que a relação peso/potência é melhor para o Osório (26 cv/t) do que para o Leopard (19 cv/t).
- Blindagem: O Leopard 1A5BR recebe uma blindagem de aço RHA (Rolled Homogeneous Armour – Blindagem Homogênea Laminada) de 10 a 70mm com uma placa de aço sobreposta de (aproximadamente) 30mm. O Osório é equipado com uma blindagem composta de alumínio/aço, fibra de carbono e cerâmica, muito mais resistente que a blindagem do Leopard.
- Eletrônica: O Leopard 1A5BR conta com um sistema de controle de fogo EMES 18, da Krupp-Altas Eletronik, que conta com um periscópio TRP-5A, para o comandante (recebendo também, a reprodução das imagens do visor térmico do atirador), um periscópio EMES-18, para o atirador (com telêmetro laser e visor térmico) e um periscópio secundário TZF-3A, para o atirador. Já o Osório contaria com um sistema de controle de fogo Marconi Centaur, equipado com um periscópio LRS-5DN, para o comandante e um LRS-5DNLC, para o atirador, ambos contando com visor noturno em seus periscópios. O sistema do Leopard tem uma leve vantagem, devido ao periscópio reserva para o atirador e o sistema EMES-18 ser baseado no sistema EMES-15, do Leopard 2, porém o Osório também tem certa vantagem em seus optrônicos, devido ao fato que seus periscópios contam com um visor noturno.
Porém, não se pode dizer que o Osório é (ou foi) o melhor tanque do planeta e que ele poderia estar sendo usado quase imutável até hoje. Há muito no blindado que deve ser modernizado para, se houvesse a possibilidade de entrada em serviço do mesmo, dar capacidades modernas ao encouraçado.
Um exemplo do que teria que ser substituído seria a eletrônica embarcada do carro de combate. O Sistema de controle de fogo Centaur, da Marconi teria que ser substituído por um sistema mais moderno, bem como os periscópios, que já uniriam eles ao sistema de visão noturna e/ou térmica, assim, excluindo o sistema de visão noturna do blindado. A instalação de um sistema de defesa ativa (como o Trophy, israelense), rádios novos e um datalink também seriam necessários. A blindagem poderia receber reforços modulares, aumentando a probabilidade de sobrevivência e o motor, teria que ser substituído por uma unidade propulsora mais potente, que gerasse uma média de 1.500 cv. Estas e outras várias modificações seriam necessárias para o Osório poder disputar com os mais avançados blindados de hoje. Porém, a possibilidade de isso acontecer é quase nula.
Muito da documentação técnica do Osório se perdeu com o tempo, após a declaração de falência da Engesa. Muito engenheiros estão aposentados e só há uma única unidade do blindado em condições de uso, mantida preservada pelo Exército Brasileiro. Hoje, a possiblidade do blindado ser posto em operação e fabricado em série é muito pequena, quase nula.
Hoje talvez, o Osório seja somente uma lembrança de bons tempos de nossa defesa e uma eterna fonte de equívocos, mas todos nós podemos ser sensatos, o Osório foi um dos melhores de seu tempo, porém, daquele tempo.