PARTE 3
Enquanto Coningham lançava este desafio ao destino, o ancoradouro de número 29 no molhe mais afastado do porto de Bari estava sendo ocupado por um navio comum do tipo Liberty, o S.S. John Harvey. Ele havia chegado há quatro dias em um comboio de nove navios cargueiros depois de uma odisseia que começara em Baltimore (EUA) e que incluía paradas em Norfolk (EUA), Orã (Argélia) e Augusta (Itália). Porém, o que o diferenciava era o seu carregamento: 1.350 toneladas de bombas contendo uma toxina conhecida pelos químicos como sulfídeo de dicloroetil. Para os especialistas do Exército era conhecida como HS, mas o nome mais comum era gás mostarda. Vários oficiais militares do porto tinham conhecimento do carregamento do S.S. John Harvey mas, pelo fato de que outros navios tinham preferência, como os que transportavam suprimentos médicos e munição, ele ficou sem descarregar encostado quase casco a casco com outros 14 navios ancorados no Molo Nuovo. Lanchas torpedeiras alemãs infestavam o mar Adriático mas os investigadores aliados mais tarde concluíram que “o navio, na época, estava no lugar mais seguro que poderia haver.”
Durante a campanha anterior, no Norte da África, nenhum depósito de gás tóxico alemão havia sido descoberto e o Quartel General das Forças Aliadas acreditava que o uso de gás pela Alemanha era “algo improvável” com exceção “em um momento crítico da guerra, quando uma utilização dessa natureza poderia se revelar decisiva”. Mas Eisenhower (Dwight Eisenhower, Comandante Geral das Forças Aliadas na Itália - N. do T.) se perguntava se este momento não estava aproximando. Baseado nas informações da inteligência italiana, ele avisou a Marshall (George C. Marshall, Chefe de Gabinete das Forças Armadas dos EUA - N. do T.), no final de agosto que Berlim havia “ameaçado que, se a Itália se voltasse contra a Alemanha, gás seria usado contra o país e a mais terrível vingança seria infligida” tanto como uma lição para os próprios italianos quanto para os outros e hesitantes aliados. O Primeiro Ministro Inglês, Churchill, também havia avisado ao presidente norte-americano Frank D. Roosevelt sobre a situação em um memorando. Os interrogatórios realizados pelo 5º Exército Americano junto aos prisioneiros indicavam uma intensificação nas preparações dos alemães para o combate químico e circulavam boatos sobre um novo gás potente e agressivo. Um relatório do 5º Exército, no meio do mês de outubro, observava que “Muitos soldados do Exército Alemão dizem: ‘Adolf vai usar gás quando não houver mais saída’”. Dezenove instalações na Alemanha eram suspeitas de fabricar gases venenosos enquanto que outras tantas estavam espalhadas pela Europa.
Vinte e oito tipos diferentes de gases haviam causado mais de 1 milhão de baixas durante a Primeira Guerra Mundial. O primeiro aconteceu com o ataque alemão de gás de cloro em Ypres em 1915. O próprio Hitler ficou temporariamente cego durante um ataque britânico de gás mostarda. Esse era um líquido que produzia, em temperatura ambiente, um vapor que criava bolhas no contato com a pele e que atacava os olhos e as vias aéreas. Nenhum comandante aliado em 1943 poderia se dar o luxo de ignorar uma ameaça alemã do uso de gás. Motivados pelas recorrentes preocupações no Mediterrâneo, Roosevelt em agosto publicamente alertou Berlim de uma “retaliação intensa e rápida na mesma moeda” caso uma guerra química se desenvolvesse. Há bastante tempo que a política aliada havia permitido o estoque de gás venenoso em grandes depósitos perto da cidade de Orã no litoral mediterrâneo da Argélia e também em outros lugares. Quando o estoque de gás mostarda foi transportado por comboio na África, policiais militares acompanharam sentados nas carrocerias dos caminhões “de modo a avisar sobre algum vazamento de gás e, desse maneira, evitar qualquer perigo para a população nativa.”
Dessa maneira, para garantir a aplicação de uma “retaliação intensa”, o Quartel General das Forças Aliadas e o Departamento de Guerra dos EUA secretamente concordaram em estocar no Mediterrâneo uma quantidade de gás venenoso suficiente para ser utilizado por 45 dias e que incluía 200.000 bombas (como os alemães seriam atacados por uma arma que deveria permanecer secreta é uma questão que nunca foi satisfatoriamente explicada). Com a aquiescência da Casa Branca, uma quantidade substancial desse material seria armazenada nos depósitos perto do front em Foggia começando com o envio do carregamento que estava a bordo do John Harvey enquanto que o sol se punha na tarde de quinta-feira.
C O N T I N U A