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Ontem o Capitão de Corveta Emilio Bianchi, homem-rã da Decima MAS e ganhador da mais alta honraria italiana, a Medaglia d'Oro al Valor Militare, comemorou seu aniversÁrio de 102 anos de vida.

 

Bianchi foi um dos seis homens-rãs italianos que entraram secretamente no porto de Alexandria na noite de 18 de dezembro de 1941, a bordo de trÊs torpedos Maiale. Bianchi prendeu seu torpedo ao casco do couraÇado HMS Valiant, que foi ao fundo apÓs forte explosão momentos depois. O HMS Queen Elizabeth teve o mesmo destino.

 

Emilio Bianchi escreveu seu nome nos primÓrdios da histÓria do mergulho de combate.

 

Buon Compleanno!!

 

 
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Entrevista com Emilio Bianchi - Mergulhador da Decima MAS

 

 

Emilio Bianchi é hoje, aos 98 anos, o último dos seis mergulhadores da Xª MASque protagonizaram a mais famosa ação da unidade, contra Alexandria, na noite de 18 para 19 de dezembro de 1941. Três “maiali” – cada um com dois homens – afundaram os couraçados HMS Valiant e HMS Queen Elizabeth, bem como o petroleiro norueguêsSagona. Acredita-se que esse ataque, sozinho, mudou a maré da guerra em favor do Eixo por mais um ano, pois a destruição dos navios permitiu que os suprimentos deRommel chegassem à Trípoli. Condecorado com a Medaglie d’Oro al Valor Militare, Bianchi concedeu esta entrevista em janeiro de 2002.Entrando na casa de Emilio Bianchi eu fiquei extasiado ao pensar nesse soldado, um dos maiores heróis da história naval italiana. Fiquei impressionado com sua modéstia; diversas vezes durante a entrevista ele falou de treinamentos e mergulhos como se qualquer um pudesse fazer isso. Também fiquei tocado por sua dedicação ao país e à marinha.

 

-Sr. Bianchi, como foi o seu treinamento?


-O treinamento foi bastante duro, na verdade muito difícil. Você só tem que parar para pensar que no meio do inverno nós mergulhávamos às 21h e passávamos a noite toda em treinamento e mergulhando com nossos “maiali”. O treinamento era muito desafiador e exaustivo, e somente nosso entusiasmo nos permitia ir em frente.

O treinamento inicial foi feito em Bocca del Serchio (a base secreta da Xª MAS), onde aprendemos a controlar o veículo de ataque, familiarizar-nos com ele e aprender táticas de ataque. Após a entrada da Itália na guerra, quando a data para um ataque estava se aproximando, treinávamos “atacando” a base da Regia Marina em La Spezia. Não podíamos alertar as sentinelas das nossas operações, então o “ataque” era realizado em completo segredo e corríamos o risco de sermos alvejados por nossos próprios soldados.

 

Nós então partimos da Ilha de Tino. Tivemos que sobrepujar as duplas linhas de defesa perto de Punta Santa Maria, perto da entrada do porto militar, e então passar por mais duas linhas de defesa perto do navio que estávamos atacando. O aspecto mais difícil era o fato de termos que operar a 15 metros de profundidade numa noite muito escura e dessa forma estávamos praticamente cegos; tínhamos que estar em perfeita sincronia com nossos colegas.

 

Para passar pelas defesas, tínhamos ferramentas especiais que nos permitiam cortar as redes sem muito esforço [isso era uma limitação da combinação gasosa nos tanques de respiração dos mergulhadores, que não permitia atividades estressantes]. Usávamos cortadores hidráulicos ou macacos pneumáticos. Uma vez que a carga estivesse presa ao casco do navio, o treinamento ainda não havia acabado. Devido ao segredo de nossas operações, tínhamos que voltar simulando uma fuga da base.

 

-Então, durante o treinamento o senhor passou pelos mesmos riscos que enfrentou em Alexandria?

 

-Eu diria que os riscos durante o treinamento eram até maiores, porque nesses treinamentos nós simulávamos circunstâncias que não aconteceram em Alexandria. Lá, graças ao nosso serviço secreto e aos batedores, nós sabíamos perfeitamente onde estavam os couraçados e como proceder. Apenas tínhamos que repetir o que fizemos durante o treinamento.

 

-Qual o foi maior perigo que o senhor já enfrentou?

 

-O maior perigo foi durante a segunda missão contra Gibraltar. Após alguns atrasos, nós conseguimos entrar no porto militar onde alguns navios ingleses estavam despejando cargas de profundidade por todo o lugar, mas sem nos dar muito trabalho. De repente, uma explosão interna [provavelmente devido aos gases formados dentro do compartimento da bateria] no “maiale”, bem embaixo da minha bunda [ao dizer isso, o Sr. Bianchi começou a rir...], causou uma parada instantânea do motor e o veículo começou a descer.

 

Eu devo lembrá-lo que nossos aparelhos de respiração não nos permitiam descer mais do que 15 metros, enquanto chegar a 30 metros era absolutamente proibido. Meu veículo continuou a descer e, ao checar o medidor de profundidade, vi que tinha ficado preso a cerca de 30 metros. Nesse ponto, o veículo tocou o fundo e parou. [Luigi Durand De La Penne, o piloto, não conseguiu recuperar o “maiale” e abandonou-o imediatamente]

 

Nesse momento, se a profundidade do mar fosse um pouquinho maior, eu com certeza teria batido as botas. Após perceber que Durand não estava mais lá, tentei consertar o “maiale” com a válvula manual, mas não deu certo. Eu então senti os primeiros sintomas de tonteira e desisti. Uma vez de volta à superfície, encontrei meu comandante, De La Penne. Veio então um barco de patrulha inglês se aproximando muito rápido, mas felizmente não nos viram e nadamos de volta para a costa espanhola [nadar às 2:30h da madrugada, nas águas geladas infestadas de navios inimigos é – nas palavras do Sr. Bianchi – a coisa mais fácil do mundo...]. Chegando à Espanha, nossos agentes nos levaram de volta à Itália. Ah sim; dessa vez eu passei perigo…

 

-Durante os mergulhos, não sentia frio?

 

-Nós usávamos uma pesada vestimenta de lã, parecidas com ceroulas, dos pés até o torso, e suéteres no topo. Então colocávamos um traje de mergulho à prova d’água. Bem, era à prova d’água só na teoria, já que frequentemente a água entrava porque o traje era muito delicado e qualquer coisa o rasgava. Era feito de tecido emborrachado e tinha a infeliz característica de enrugar abaixo de 10 metros ou mais. Essa ação criava algo parecido com pinças dentro da roupa, que agarravam e puxavam sua pele. Uma vez fora da água no fim dos treinamentos, parecia que eu tinha sido chicoteado. Na cabeça usávamos um gorro de lã, mas a água entrava, causando cãibras terríveis; mas depois a água dentro do gorro esquentava e a dor desaparecia.

 

-Após o ataque a Alexandria o senhor foi capturado. Como os ingleses o trataram?

 

-Os primeiros marinheiros ingleses que nos viram riram de nós, achando que tínhamos falhado, mas logo os oficiais superiores perceberam a situação. Eles nos fizeram tirar nossas roupas e fomos trazidos para a praia. Lá, dois oficiais que falavam italiano – até melhor que nós! – nos interrogaram um a um. Os oficiais ingleses nos ameaçaram e apontavam para uma pistola na mesa, mas sabíamos que era apenas um truque para nos assustar e nos fazer falar; não dissemos nada. Nesse ponto, fomos trazidos de volta a bordo doValiant e trancados numa sala abaixo da linha d’água, na esperança de que disséssemos onde estava a bomba. Sabíamos que rapidamente a carga explodiria e estávamos esperando a explosão com alguma ansiedade. Quando aconteceu, balançou todo o navio e nos deixou no escuro. Eles vieram nos pegar e nos levaram para a costa; aqui eu notei, com grande prazer, que o navio começava a se inclinar.

 

Eu gostaria de ressaltar que os couraçados não foram afundados, mas apenas colocados fora de ação em águas rasas* [ele só diz isso pra diminuir os próprios feitos...]. Após o ataque, fomos levados para a Palestina, numa área chamada Latrum, por cerca de 8 meses. Então, depois de El Alamein, com o medo de que os alemães cruzassem o Canal de Suez, os três oficiais foram levados para a Índia, enquanto o restante de nós foi levado à África do Sul em Transvaal [gostaria de mencionar que o Sr. Bianchi tentou a fuga duas vezes. Eu somente descobri isso após ler suas memórias, porque durante a entrevista ele não mencionou isso, provavelmente por modéstia]. Os três oficiais e Marino retornaram à Itália imediatamente após o Armistício; enquanto usando alguns argumentos sobre minha saúde, decidi ficar no campo de prisioneiros até o fim da guerra. Eu não queria voltar à Itália porque não sabia o que fazer; teríamos que lutar contra nossos irmãos [referindo-se à guerra civil].

 

-Se tivesse voltado à Itália, o que acha que teria feito?

 

-Eu acho que, tendo conhecido Borghese e seus homens, eu teria acabado me juntando à “Repubblica di Salò”, também porque não se pode começar uma guerra e num dado ponto dizer ao seu antigo aliado [a Alemanha] que agora ele é um inimigo. É uma questão de ética, de consciência. Se eu tivesse voltado, não poderia enxergar os ingleses como meus amigos e os alemães como inimigos. Eu gostaria de mencionar algo que Tesei me disse: “Não importa se a guerra é ganha ou perdida, o que importa é lutar bem”. O Alto-Comando fez tudo que podia para lutar mal. Após nossa ação em Alexandria, a Marinha não tomou vantagem de nossa esmagadora superioridade; evidentemente nós não tínhamos bons estrategistas!

 

-O que o senhor acha da não-ocupação de Malta; foi o maior erro da Itália?

 

-Me deixe apenas dizer que em 10 de junho de 1940, logo após ouvir o anúncio pelo rádio, Tesei disse: “Agora a Regia Marina deve imediatamente eliminar Malta a qualquer custo!” Eu digo, será possível que um oficial de engenharia naval poderia entender a real importância de Malta, enquanto os grandes almirantes não estavam nem se ligando? Malta cobraria indubitavelmente um preço alto; deve-se pensar nos nossos pobres soldados na África, que nem mesmo munição tinham. Num certo ponto, a ilha estava exausta, nós poderíamos tê-la conquistado com pequenos riscos, mas nunca fomos lá… O que poderíamos fazer? Não era nossa responsabilidade [ele diz com clara amargura em sua voz].

 

-Uma última pergunta Sr. Bianchi. Porque o senhor acha que, entre os seis homens da missão de Alexandria, o seu time é o mais famoso?

 

[O Sr. Bianchi não respondeu. Não sei se foi por modéstia ou porque ele não deseja reiterar as acusações de protagonismo excessivo que sempre seguiram De La Penne].

 

Meus infinitos agradecimentos ao Sr. Emilio Bianchi por sua disposição e honra em atender-me. Também gostaria de agradecer ao Sr. Enzo Casciani e ao Sr. Lorenzo Salvestrini, que possibilitaram este encontro.

 

Fonte: Regiamarina.net - Sala de Guerra

 

*NOTA: A questão do conceito de “afundamento” já foi discutida aqui na Sala de Guerra. Pessoalmente concordo com o autor quando ele diz que Bianchi tentou diminuir o valor de seus próprios feitos dizendo que “não afundou” o HMS Valiant. Ele é sem dúvida uma grande pessoa, com quem tive a maravilhosa oportunidade de me corresponder dois anos atrás.

 

 

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